“E cantavam um novo cântico, dizendo: Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação”.
Em Apocalipse 5:9 somos introduzidos à diversidade da criação e do reino de Deus. Não somente somos feitos à imagem e semelhança do Pai, o que nos confere valores únicos no plano cósmico, como também individualmente pertencemos, graças ao sacrifício de Cristo, à promessa de uma eternidade racialmente reconciliada.
A negação da diversidade
O conceito de raça não é bíblico e muito menos biológico, mas tem sido socialmente definido pelo conjunto de fenótipos, textura capilar, traços faciais e cor da pele. A “raça”, nesse sentido provisório, é o que me torna visualmente diferente do outro, compondo parte da minha identidade, me incluindo em tribos urbanas e me classificando em grupos de riscos ou privilégios sociais. No Brasil, ser negro é participar de estatísticas de marginalização, desemprego e baixa escolaridade, uma consequência do passado escravocrata colonial que se perpetua, ameaçando continuamente o bem-estar social.
O racismo divide a realidade. É um fracasso em amar o próximo. É pecado. A Bíblia apresenta fundamentos firmes para condenar essa ofensa e nos oferece exemplos contextualizáveis desde a época do Apóstolo Paulo, quando a discriminação de gregos, gentios e samaritanos pelos judeus era constante. O que aprendemos em sua Carta aos Romanos é o que deveríamos aplicar em nossa sociedade e Igreja. Não há distinção, perante Deus, de negros e brancos.
O propósito da diversidade
“Anunciai entre as nações, a sua glória; e entre todos os povos, as suas maravilhas. Porque o Senhor é grande e digno de ser louvado” (Salmos 96:3,4).
Para alcançarmos a graça e a justificação, não há nenhum critério racial; todavia, é em nossas diferenças e cores que podemos juntamente glorificar ao Senhor. A diversidade racial é uma forma, construída e planejada por Deus, de o louvarmos.
Em Atos 2, o Espírito Santo desce sobre toda a Igreja em Pentecostes. O que tornava as pessoas diferentes umas das outras, o seu idioma, foi assim transcendido. Apesar de não se comunicarem pelo mesmo dialeto, a Bíblia nos diz que todos entenderam a mensagem revelada pelos apóstolos. As diferenças não foram obstáculos para serem alcançados por Deus, assim como hoje, em meio à divisão racial, elas não serão motivo para a divisão entre povos na Eternidade, muito menos para o desenvolvimento da fé, o resgate na cruz e nossa salvação em Cristo Jesus. O Pentecostes, no Novo Testamento, é uma sinalização do que acontecerá na reconciliação racial. Seres humanos diversos, mas unidos como filhos de Deus.
A redenção da diversidade
A misericórdia nos livra da raiva, tristeza e mágoa deixadas pelas ofensas que sofremos. Somos então, capacitados a perdoar e a pedir perdão, a amar nossos inimigos e nos reconciliarmos, por meio da fé em Cristo, engrandecendo aquele que nos deu vida.
“Sejam bondosos e compassivos uns para com os outros, perdoando-se mutuamente, assim como Deus perdoou vocês em Cristo” (Efésios 4:32).
Nossa disposição de perdoar os outros, assim como somos perdoados em Cristo, é um fator necessário para atingirmos uma forma de reconciliação na Igreja. Acumular mágoas é negar a graça que Deus nos oferece misericordiosamente. Termos nossa paz em Cristo, confiando que todas as injustiças do mundo já estão julgadas, nos fornece o combustível para perdoar nossos ofensores. É importante saber, também, que o perdão não significa que atos racistas não podem ser confrontados, mas que o mal não será causador da destruição pessoal.
“Nenhuma palavra torpe saia da boca de vocês, mas apenas a que for útil para edificar os outros, conforme a necessidade, para que conceda graça aos que a ouvem. Não entristeçam o Espírito Santo de Deus, com o qual vocês foram selados para o dia da redenção” (Efésios 4:29,30).
O arrependimento é outra característica em um ambiente de reconciliação. O coração pecador é motivo de tantas feridas causadas pelo racismo: o orgulho, a arrogância, a perversidade; a apatia pelo próximo e indiferença perante injustiças. Essas deficiências do nosso coração necessitam de transformação, pelo poder do Evangelho: a mesma Palavra misericordiosa que precisamos buscar se desejamos dar bom testemunho perante o mundo, cuidando do reino presente e sinalizando aquele que há de vir, o corpo de Cristo em sua plena diversidade.
Nos humilharmos devido ao nosso pecado faz parte da caminhada cristã, aprofunda nossa relação com o Criador e intensifica a gratidão que devemos a Ele. O arrependimento do pecado do racismo é o reconhecimento do pecado contra o próprio Deus.
A reconciliação racial é uma conquista da cruz. Cristo morreu para que todos os pecados fossem perdoados e a injustiça cessasse. Promover a harmonia entre os povos de Cristo é responsabilidade da Igreja, capacitando seus membros, exortando atitudes discriminatórias e estabelecendo testemunho. A participação da comunidade cristã nesse processo demonstra a verdade que fomos todos criados para glorificar a Deus, Senhor de todas as raças e nações, propositalmente criados.
A prática da diversidade
A diversidade do corpo de Cristo deve ser admirada e prezada, e até mesmo buscada. Se a diferença racial e étnica foi colocada por Deus em sua criação, ela deve ser espelhada na Igreja, preanunciando o reino Eterno. Essa pauta não necessita ser levada como a prioridade da comunidade, mas ignorá-la é fechar os olhos para uma as formas de revelação da beleza e glória perfeita do Pai.
A responsabilidade pessoal de orarmos pela ajuda e sabedoria de Deus ao avançarmos na reconciliação é outro passo de testemunho e dedicação a vida cristã. Importar-se com a criação e com os planos divinos é conhecer uma faceta daquele que nos criou. Que o Evangelho possa fazer com que as pessoas, e Igrejas, busquem a diversidade, a harmonia entre raças, a comunhão entre irmãos e a manifestem em nossos espaços de profissão de fé e vida comum.
“Pois todos fomos batizados por um só Espírito para ser um só copo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres; e a todos nós foi dado beber de um só Espírito” (Coríntios 12:13).
• Ana Staut, criada em L’abri e estudante de jornalismo. Escreve sobre arte, cosmovisão cristã e comportamento.
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